Dia 25 de julho se torna símbolo da luta de mulheres negras contra violência estrutural e preconceito

Mulher Negra INTERNO SITENesta segunda-feira, dia 25 de julho, duas datas propõem intensificar o debate sobre a posição da mulher negra em nossa sociedade, e de que forma estas pessoas são impactadas pelo racismo e o machismo estrutural. Em todo o mundo, celebra-se o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, e, aqui no Brasil, também se comemora o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra. Tereza de Benguela foi líder quilombola e se tornou símbolo da resistência negra durante a escravidão.

A discussão proposta por estas datas é imprescindível à Psicologia, que chama a sociedade para a reflexão sobre este cenário de opressão e violência contra as mulheres negras. Para a psicóloga Jociane Lessa (CRP 09/3794), que é psicoterapeuta Existencial Sartreana e mestra em Psicologia Social e Feminista Interseccional, o Julho das Pretas - como foi batizado o mês de julho pelo Odara - Instituto da Mulher Negra em 2013, por causa das datas celebradas hoje -, é importante principalmente para denunciar o processo ideológico que inferioriza determinados povos e adotado como justificativa para a colonização, mas segue fortemente ativo nos dias atuais para justificar a pobreza, a necropolítica, o encarceramento em massa e as intolerâncias religiosas, entre outros temas que afligem principalmente a população negra.

"É muito importante que este seja um tema cada dia mais debatido e que continue assustando as pessoas que não querem enxergar a realidade e a predominância de tais ideologias e comportamentos racistas em suas vidas cotidianas. O Julho das Pretas coloca no centro do debate a importância da luta e da força das mulheres negras. Para quem está de fora desta luta, a data também pode ser um lembrete de que a população preta existe e resiste, apesar de todas as tentativas de aniquilamento", ressalta Jociane.

Para a psicóloga Cida Alves (CRP 09/01289), que é Doutora em Educação pela Universidade Federal de Goiás e atua na área de políticas públicas e cuidado em saúde mental, no Núcleo de Vigilância as Violências e Promoção à Saúde da Secretaria Municipal de Goiânia, as políticas públicas e as estruturas de cuidado em saúde mental, incluindo a Psicologia, precisam ter uma atenção intensificada em relação às mulheres negras, diante da situação vulnerável em que elas se encontram dentro de nossa sociedade.

"Acompanho há mais de 25 anos na rede pública de saúde de Goiânia pessoas em sofrimento psíquico em decorrência de violências. A misoginia, a cultura do estupro, a visão patriarcal de nossa sociedade, que coloca a mulher como uma 'sub-cidadã' e que a explora como um corpo objetificado, atingem todas as mulheres - brancas, indígenas, negras. Mas existem situações em que a mulher negra é muito mais vulnerabilizada. Nós sabemos que a mulher negra passa por mais violência obstétrica, mais violência institucional nos serviços de saúde. As principais vítimas da exploração sexual e do tráfico de pessoas são as mulheres negras. Vemos uma gritante desumanização da mulher negra. O princípio de equidade, que é um dos valores basilares do sistema público de saúde, nos diz que precisamos oferecer mais para quem tem menos. Então, quem sofre mais e tem menos direitos precisa sempre ter uma atenção muito maior por parte de toda a sociedade", alerta Cida.

As psicólogas alertam que o sofrimento derivado do machismo, do racismo, da misoginia e de outras formas de violência frequentemente praticadas contra as mulheres negras pode prejudicar a saúde mental de uma pessoa em diferentes níveis, ocasionando um adoecimento mental que interfere em todos os aspectos de sua inserção na sociedade. Para Jociane Lessa, toda esta estrutura acaba por desumanizar a mulher negra de forma cruel e violenta, dificultando o desenvolvimento de suas potencialidades e sonhos.

“Historicamente, a mulher preta foi definida como forte, guerreira, ao ponto de suportar toda sorte de dor e sofrimento que outras pessoas não suportariam. Essa também é uma construção que remonta ao período escravocrata e que permanece nos dias atuais, tendo como principal consequência o não reconhecimento e o desrespeito à dor da mulher preta. Não reconhecer e não respeitar a dor de uma pessoa é tirar dela sua própria humanidade, é torná-la coisa, alguém com quem não se precisa ser empático e nem cuidadoso. Sendo coisificada, não há muitas possibilidades aceitáveis: se a preta aceita esse lugar, a carga nunca cessa; se ela reage, é tida como raivosa e agressiva. Subjetivamente, pode fazer com que a mulher creia que precisa dar conta de tudo sozinha - não acionando sua rede apoio quando necessário, a autocobrança e o perfeccionismo podem ser intensos e adoecedores, as relações interpessoais podem se configurar como locus de servidão ao outro e, não raro, há um negligenciamento dos limites do corpo e da mente pela crença de que tais limites não deveriam existir”, define Jociane.

Na visão de Cida Alves, o papel da Psicologia em analisar e entender este contexto deve passar por uma constante reavaliação da própria categoria em relação às teorias e práticas adotadas, que precisam estar em consonância com a realidade brasileira, sem ignorar o contexto histórico e social em que estas pessoas estão inseridas.

“A psicologia precisa entender que, na nossa sociedade, o processo de subjetivação de cada indivíduo passa pelo elemento cultural. No sistema capitalista e patriarcal, a mulher negra vive, desde a sua concepção, uma violência estruturante da sua identidade e da sua autoestima, que é essa ideia de que existem pessoas inferiores e pessoas superiores. Nós temos uma visão, que inclusive foi corroborada e construída pela própria Psicologia, de que a mulher é incompleta enquanto ser, e de que ela só se completa pelo olhar do desejo masculino ou pela maternidade. Precisamos romper completamente com esta lógica. O próprio conceito de histeria coloca na mulher o estigma de desequilibrada. Precisamos romper totalmente com isso. A mulher negra é também muito estigmatizada, sempre vista sob uma óptica hipersexualizada e objetificada. Devemos ter o cuidado, durante a nossa prática psicológica, para não reproduzir esses conceitos, que limitam a mulher negra a este espaço de estereótipos. Precisamos rever constantemente a nossa teoria e a nossa prática", analisa Cida.

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